sexta-feira, 15 de outubro de 2010

5. Costela trincada

            Um tal de Tiãozão Matador aprontava muitas das suas no pequeno povoado de Brejo dos Mártires. Quando a PM chegava ao local de suas peripécias, ele evadia pelos fundos de sua casa, que era cheio de moitas de espinhos, estrategicamente plantados para facilitar a fuga e atrapalhar a ação da polícia. Valendo-se de sua corpulência, o Tião arrancava mato no peito, pisava em prego, pulava muros e sempre conseguia se safar.
Traçado o plano para agarrá-lo deslocou todo o efetivo policial da cidade(como sempre dois militares) para o local onde cometera mais um crime. Tendo em mente que não seria uma prisão fácil, os PMs equiparam-se com grossos bastões de madeira e reuniram toda a coragem que havia disponível.
Na casa, um PM ficou no espinhoso quintal e o outro na frente. O da dianteira da residência deu as graças:
_ Matador! É a polícia, saia com as mãos para cima!
Ao ouvir aquele chamado intempestivo o Tiãozão despertou do sono e saltou para o quintal, porém lá deparou com um militar. O PM, apesar de ter ouvido falar, não conhecia o famoso brigão pessoalmente, quando o viu e avaliou suas dimensões, ficou na dúvida se corria contra ou a favor do Tiãozão. O militar teve puramente o impulso involuntário de levantar o bastão de madeira, não sabendo precisamente se ia atacar ou se defender. Sei que, quando o autor viu o pau armado em sua direção, deu rápida meia-volta, arrebentou a porta da frente e saiu correndo, dando de cara com o outro PM.
Ficaram ali alguns segundos, olho no olho, um silêncio total. O PM movia-se para um lado, o Matador para o outro, até que resolveu sair correndo... o Matador é claro.
No momento que o grandalhão tentou sair pela tangente, o militar se viu obrigado a voar no seu pescoço e tentar dominá-lo. O colega que estava nos fundos, percebendo que o parceiro estava em dificuldade, correu para acudir..
Ele veio de lá do quintal com um chute mentalmente programado. A distância, mirou no estômago do indivíduo. Quando chegou perto, aplicou um pontapé com toda a força e velocidade adquirida no embalo. Vendo que seria seriamente atingido, o Matador virou-se repentinamente de costas na tentativa de se proteger. Devido a seu porte físico avantajado, no momento em que se virou, o PM que estava grudado igual a carrapato em seu pescoço tornou seu escudo.
O militar que desferiu o chute até pôde perceber a virada, só que de tão forte que tinha sido o pontapé não mais poderia freá-lo, tampouco pará-lo, assim o bico do coturno acertou em cheio as costelas do colega de farda, que sem saber ao certo o que lhe atingira, soltou um berro estridente:
 _Ai, filho duma égua. 
O militar atingido largou do pescoço do cidadão infrator, afastou da cena e curtiu a dor observando o agarra-agarra que agora seu colega de farda protagonizava com o grandão. Tentava inutilmente disfarçar a dor. Abotoava e desabotoava o botão da gandola, próximo ao local atingido e sutilmente com a pontinha do dedo mindinho, alisava a região machucada.  
O fato ocorreu por volta das três da matina e o povo já tinha acordado para acompanhar tão aclamado episódio, afinal se tratava de um cidadão que apesar de muito aprontador, nunca tinha sido preso e todos ali o temiam.
            Recuperado da dor e já tendo clara visão do que acontecera, o militar machucado planejou dar o troco. Ficou imaginando que aquele chute tinha sido de propósito. Dias antes, os dois haviam discutido acerca de um leite que, um comprava, dois bebiam e só um pagava. Pensando ser este o motivo do chute, falava consigo mesmo enquanto olhava para o porrete:
            _ Ah, eu desconto!
            Porém, como a honra e o dever militar fala mais alto, e o código de ética e disciplina, que trás punições para divergências desta natureza, havia sido estudado a pouco, reconsiderou e deixou para uma próxima oportunidade. 
            Pôs então o corpo no lugar, ajeitou a coluna, verificou que não havia nenhuma costela quebrada, e voltou à ação, segurando desta vez, com bastante firmeza o autor.
            O Matador, algemado dentro da viatura, fixou o olhar nos bastões de madeira cada um mais grosso que o outro e talvez esperando uma (inimaginável) represália por parte dos policiais, já foi logo dizendo: "Seu pulícia! Este apelido de Matador é por que eu trabalhava num açougue, eu matava gado. É só por isso!"

2 comentários:

Comente esse caso!