quarta-feira, 20 de abril de 2011

18. A motocicleta da discórdia

Aquele motociclista já estava passando dos limites. Subia e descia pelas ruas fazendo um barulho irritante e ensurdecedor. O dispositivo utilizado para diminuir o ruído emitido pelo veículo, a descarga, estava quebrado e o motoqueiro parecia gostar daquilo. A população ligava insistentemente para o quartel reclamando do estardalhaço que a moto promovia.

Uniu-se o barulho da moto mais o insessante e irritante toque do telefone para tirar o Policial Militar do sério. Já não agüentava mais aquela ladainha.

Saiu à procura do tal motoqueiro. Numa rua acima do quartel o viu passar ao longe, fazendo barulho e empinando aquela porcaria (o primeiro dos muitos adjetivos que o PM atribuiu ao veículo).

É pura provocação, ele pensava: “Bastou o motoqueiro olhar para mim para segurar o acelerador lá no final”. Aquele caco velho (adjetivo de número dois) roncava alto e ainda dava disparos semelhantes ao de um revolver.

O militar ficou possuído pela raiva - fato que dificilmente acontece – tanto que nem mesmo procurou um outro colega para auxiliá-lo na busca do que posteriormente intitulou de “amante do barulho e adorador do incômodo alheio”. Partiu sozinho com o objetivo de fazer a apreensão daquela motocicleta velha e a prisão do dono dela.

O ódio que o consumia também serviu de combustível para impulsioná-lo a localizar de forma instintiva o motoqueiro. Passaram três motocicletas, só de ouvido ele identificou qual que seria seu alvo. Do piloto, ele não guardou nenhuma característica de tão vidrado que estava com a moto. Correu as ruas da cidade até que avistou a motocicleta parada na porta de um boteco.

O militar estava à paisana (sem farda), mas como a cidade era pequena e já trabalhava ali há alguns meses, supôs que todos lhe reconheceriam, assim sendo não corria o risco de sua autoridade ser posta sob suspeita por alguém.

Entrou no barzinho cuspindo fogo, o coração estava palpitante, os olhos arregalados, aquela veia da testa estava para estourar, aquele seria o momento crucial, seria a hora certa, o dia “D”, o momento exato em que se deleitaria em prender o desordeiro e sua ensurdecedora motocicleta. Nada podia dar errado, quem poderia o impedir agora?

Deixou a boa educação de lado e partiu logo para a ignorância:

_De quem é aquela porcaria estacionada ali fora? - Bradou alto e forte.

Antes, porém ordenou que o dono do bar desligasse o som.

_Ô nego velho tem jeito de dar uma abaixadinha no volume aí, só para eu mandar um recado? - Por diversas vezes havia gritado e ninguém tinha lhe escutado, no quarto grito, com o som desligado, todos puderam prestar atenção nele. Pela quinta vez gritou ainda mais nervoso:

_ De quem é aquela porcaria vermelha lá fora?

Levantou-se de lá do balcão, um homem que não era menor do que o gorutubano do Davi e Golias. Era um monstro a julgar pela sua estatura. Não tinha menos de noventa centímetros de braço, e as pernas pareciam uns troncos de árvore. Caminhou em direção ao militar, estufou os peitos, cuspiu o cigarro de lado e disse:

_ Se a porcaria vermelha a que você se refere é uma moto que está estacionada lá fora, ela é minha. Por quê?

O militar parou, olhou o tamanho do camarada, pensou (...) pensou e sutilmente perguntou:

_ Quer vender ela? Se quiser mil contos eu dou agora? - Foi a única frase e possivelmente a mais inteligente que podia ter saído da boca do PM naquele momento.



Um comentário:

  1. hahahaha que lero, nao é possivel...agora sei pq a motocicleta fazia barulho, nao suportava o peso do cara rsrsrs.
    e eu no lugar desse pm dava ate 300 a mais kkkk.

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